terça-feira, 6 de setembro de 2011

Reflexões e outras mariquices

Gosto particularmente de hospitais. Mas a ideia que eu tenho de um hospital é completamente absurda, tendo em conta que hoje passei a manhã num e só me queria vir embora.

Na minha cabeça, um hospital é um local de repouso e cura, onde os profissionais de saúde colaboram uns com os outros, com respeito e estima pelo trabalho de cada um, onde há alegria e optimismo, onde os utentes têm um lugar adequado para esperar e uma estadia cómoda enquanto recuperam de alguma intervenção médica, onde todos os organismos conspiram para que a higiene se mantenha e todas as pessoas envolvidas por esse ambiente possam exprimir tranquilidade.

Mas é o completo oposto. Utentes recaídos em bancos de plástico, a ler revistas do ano passado ou com o tédio estampado no rosto, enquanto esperam para serem atendidos e pensam nas burocracias necessárias para serem merecedores de cuidados. Os médicos passam em duos, trios, grupos pequenos, a conversar alegremente e a beber café nos copinhos brancos, sem tomarem uma atitude perante o que vêem, como se fossem turistas ricos na Índia, sem darem conta da pobreza do povo. Os enfermeiros idem, mas desta vez vão sozinhos, como amantes que se encontram às escondidas e precisam de combinar uma hora diferente para aparecer de novo no salão do baile. Quem eu vejo a trabalhar e a preocupar-se com os utentes são os auxiliares e os voluntários, que aparentemente são o fundo da hierarquia, mas que agem como os verdadeiros curandeiros, que movem lençóis e fronhas lavadas, que alimentam quem não consegue pegar num garfo, que oferecem o pequeno-almoço a quem está em jejum, e que ajudam quem tem dificuldade a andar. Está tudo ao contrário.

O ar respira-se com dificuldade, e tem o cheiro da entrega à dor e ao sofrimento, às lamentações e ao aborrecimento. As salas de espera são rudimentares, como se fossem um curral para despojo de animais e que se vão resgatando um a um. O ambiente sabe a tosse, a escarro e a febre, uma febre fria, densa e obcecada. As enfermarias são vazias e secantes, camas brancas, uma 'poltrona' e uma televisão ligada num canal aborrecido.Sentem-se os desabafos mudos dos doentes, que gritam socorro mas não conseguem abrir a boca.
E quem são esses doentes? Quem são as pessoas que passam os seus dias numa hostilidade cruel? São idosos, praticamente. Seres que não têm alegria na vida e deixam-se refugiar nos braços da velhice e da doença, que encontram nos hospitais uma desculpa para sair de casa e conversar um pouquinho. Não se iludam quem acha que um hospital tem o ambiente de uma série americana. Não. É um centro geriátrico, e é por isso que, segundo a minha opinião, se assiste a tal desequilíbrio profissional. Não há diagnósticos enigmáticos nem casos complicados. Há velhinhos que precisam de uma palavra de apoio porque já perderam toda a auto-estima e se sentem cacos da sociedade, um fardo para o mundo.

Hoje estava a ajudar uma senhora a levantar-se e a equilibrar-se nas muletas, e ela diz-me 'Quando não há família ou quem se preocupe connosco é assim. Às vezes as pessoas de fora são mais queridas que os nossos. Deus lhe pague'. É triste não ter ninguém e passar a etapa final da vida completamente sozinho. E infelizmente este fenómeno vai aguçar-se, devido ao envelhecimento progressivo da população.

Mas é isso. Um hospital é isso. O oposto total da minha visão, enquanto filantropa e aspirante a médica.

3 comentários:

  1. bem...eu tenho dito imenso ultimamente...Rose, tu com essa ideia do hospital não podes ser deste nosso planeta =P

    xoxo

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  2. C'est vrai, Teresa. Eu venho de uma galáxia distante e estou na Terra para ajudar a humanidade a evoluir.

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  3. E com um gesto de cada vez podê-lo-ás fazer.
    Também tenho uma visão diferente da da realidade e quando chegar a minha vez, se poder agir contra isso, irei fazê-lo. A melhor cura que há são gestos de carinho, de amor, basta um pouco de atenção para se o processo de recuperação, na maioria dos casos. Beijinhos

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