quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Qualquer semelhança com sintomas de demência é pura coincidência

A minha relação com os outros é um tanto ou quanto contraditória e paradoxal, isto porque não tenho uma noção definitiva acerca do que as pessoas representam para mim, assim como o que eu represento para as pessoas. E aviso já que este post pode vir a destacar, e muito, o meu lado negro.

Para começar, sempre me habituei à solidão. O nada foi sempre uma companhia constante na minha vida, a falta de contacto e a carência de afectos foram (ainda são) vivências que me vão marcando, e que tiveram o seu papel na minha fraca auto-estima (auto-estima a nível físico, que sou muito fã do meu carácter) e na falta de confiança que tenho nos que me rodeiam. Mas por outro lado, permitiu-me estudar a humanidade num nível mais pormenorizado e construir-me de modo a que eu me fosse aperfeiçoando. Assim sendo, eu sou quem gostaria que fosse para mim, isto é, vou sendo (porque ainda não me conheço totalmente) a pessoa que gostava de conhecer noutro alguém. Por isso é que falo mais comigo do que com qualquer outra pessoa e considero-me a minha melhor amiga. Confio mais em mim do que em qualquer coisa. É como se tivesse criado uma relação com o meu próprio 'eu', eu sou o meu próprio amigo imaginário. Isso faz com que eu seja independente, desenrascada, e com uma grande maturidade para a vida e para as responsabilidade que dela advêm. Eu não preciso dos outros para sobreviver, sou capaz de o fazer, e bem, sozinha. Para além disso, através do meu estudo da humanidade, hoje conheço muito bem as pessoas, analiso-as correctamente sem precisar de muitas informações ou muito tempo, porque aprendi a reparar nos detalhes de cada um, que são os aspectos mais importantes, ou seja, os homo sapiens sapiens vão expondo pedacinhos de si, inconscientemente, mesmo que não queiram, e eu aprendi a pegar nesses pedacinhos e a lê-los. Provavelmente conheço melhor uma pessoa que ela própria. E por isso sei ajudá-la.

Acredito que vim ao mundo para ajudar a espécie a que pertenço, porque sinto um bem-estar muito grande quando sou capaz de dar auxílio. É como se todo o meu interior ficasse em júbilo por ter encontrado o caminho da felicidade para uma certa pessoa, aliás, para qualquer pessoa. Não tenho quaisquer problemas em conversar, aconselhar ou confortar um completo estranho que me pareça infeliz. Tanto que creio que é uma falha da sociedade. Os indivíduos passam uns pelos outros, todos os dias, e não há qualquer tipo de comunicação nem conhecimento. O ser humano é reduzido à meia-dúzia de relações que estabelece.

Mas eu recuso-me a viver assim. Não sou capaz de olhar apenas para mim ou para quem me é relativamente próximo, tenho necessidade de falar com estranhos, conhecer estranhos, ajudar estranhos, como se precisasse que a minha voz se fizesse ouvir nos quatro cantos da Terra. Porque eu tenho tanto para dizer, tantas ideias correm na minha cabeça, sobre tudo quanto pode existir, e eu quero partilhá-las com toda a gente. Provavelmente parece completamente anormal eu perguntar a uma pessoa aleatória se ela é feliz, ou se precisa de desabafar com alguém porque tem um olhar triste, mas é o que eu faço constantemente. O ser humano preocupa-se com o que se interessa, e eu interesso-me pela humanidade inteira. Já levei todo o tipo de respostas e insultos nessas ocasiões, mas por vezes compensa. Um dia estava na paragem de autocarros e perguntei à senhora que estava do meu lado se ela era feliz. Instantaneamente os olhos da senhora humedeceram-se e ela respondeu-me que tinha um sofrimento muito grande, que o filho era toxicodependente e nem ela nem o marido sabiam o que fazer para o salvar. E continuou a desabafar, e eu dava-lhe a mão e palavras de ânimo para que continuasse a sua luta pelo filho. Quando a camioneta dela chegou, disse-me que falar comigo a tinha ajudado. Não consigo descrever o que senti, tinha conseguido encaminhar alguém para o caminho da persistência, para além de ter aliviado a dor dessa pessoa. E a partir desse momento, percebi que essa senhora tinha valido por todas as que me trataram mal quando falei com elas. Afinal, quantas vezes tudo o que precisamos é que alguém seja capaz de ver a nossa dor e perguntar-nos o que se passa?

Eu toco às portas dos corações de toda a gente, mas só quem me abre a porta é que me permite entrar e aliviar o sofrimento que lá possa haver. Não sou capaz de resolver os problemas, porque cada um é responsável por isso, mas sou capaz de dar as soluções. Eu mostro o caminho da felicidade e da liberdade, mas têm de ser as pessoas a segui-lo, que não posso forçar ninguém.

E é exactamente por eu ter aprendido a não confiar totalmente em alguém, que as pessoas podem confiar totalmente em mim. Sou um autêntico porto seguro, para qualquer tipo de barco.

2 comentários:

  1. E eu que o diga :PP
    Ajudas mais os outros que a ti mesma. Sabes que não tem mal nenhum, por vezes, pensarmos mais um bocadinho em nós. Mas fico muito feliz por saber que contar-te os meus problemas ou outras coisas não são uma seca para ti eheh

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  2. Não sei se alguma viste o filme "Patch Adams", mas é um filme espectacular que fala de um homem que decide ajudar os outros e para isso torna-se médico. Mas vai ser um médico diferente, um médico que quebra barreiras, que não tem medo de fazer rir as crianças e saber quais os sonhos dos pacientes. Tu recordaste-me dele. E sinto-me orgulhosa ao ver que a minha amiga tem essa mesma preocupação e esse mesmo efeito. São os tais pequenos gestos que tu tens que tornam o mundo melhor. Mas lembra-te de ti no meio desse processo, porque quanto melhor cuidares de ti, melhor poderás cuidar dos outros e exercer o teu "poder". Beijinhos

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